Ninguém gosta de pensar nisso, mas é bom que se pense. Os religiosos mais ainda, já que acreditam em Deus e na vida eterna. Mais dia menos dia você será chamado a devolver alguém de sua casa para Deus: uma bisavó, uma avó, um velho tio, o nono, um doente terminal ou até mesmo um filho. Acontece com milhares de pessoas todos os dias.
Em alguns casos é dramático. Não se esperava naquela hora e daquele jeito. Noutros o desfecho era mesmo aquele. Conto uma estória para, quem sabe, ajudar você, naquela hora em que muita gente, desnorteada, não sabe o que dizer e fazer além de chorar.
Um amigo meu, excelente pessoa e excelente médico, fez o que podia pelo seu pai que morria de câncer no pulmão. Esgotados os recursos da medicina preparou a família. - Papai não tem mais do que algumas semanas de vida. Mas ele durou mais do que o previsto. Parecia lutar herculeamente contra a morte. Foi quando ele me disse: - Se puder ajudar papai a morrer sereno eu lhe agradeço. Era o médico chamando o padre que supostamente deve entender disso mais de que os outros. Fomos juntos. Ele segurava a cabeça e eu as mãos do pai, cuja agonia já levava dias. Depois de orar por ele, já que orar junto ele não podia mais, eu disse bem calmo e pausadamente, mais ou menos o que segue:
- Seu José. Se está me ouvindo quero que mexa os olhos. Ele mexeu. - Nós não sabemos tudo o que lhe vai aí no coração, mas, se o senhor está querendo ficar neste mundo para, quem sabe, cuidar de sua esposa a quem o senhor ama tanto, ou quem sabe tem algo a resolver ficando por aqui, então vale à pena tudo o que está passando. Mas, se quiser voltar para Deus agora e descansar, seus filhos cuidarão de tudo, e eu falarei com sua esposa que o senhor foi cuidar dela junto de Deus. Se o senhor está querendo partir, pode ir tranqüilo. Sua família saberá viver o que o senhor ensinou. Fez uma família linda e boa. Mas agora seu corpo está dizendo que é hora de descansar e seu coração, pelo jeito, quer partir. Eu vou falar com Deus e, enquanto eu falar, se o senhor quiser, fale junto e, se achar que já pode se entregar, eu o devolvo a Ele em nome de nossa Igreja e de sua família. Temos orgulho do senhor. Pode ir, se quiser. Nós nos cuidaremos e cuidaremos de tudo por aqui.
Comecei a orar, ele penosamente abriu os olhos, olhou ao redor, viu o filho, olhou-me. Tornou a fechá-los e, uns três minutos depois, respirou fundo e pela última vez. Tinha ido. Conversando depois, meu amigo médico agradeceu e disse: - Papai morreu bem. Ele estava precisando de alguém que lhe dissesse: Vai seu José. Você disse isso do jeito certo.
Palavras ajudam a viver e a morrer bem. Saiba devolver a Deus aqueles que faz tempo que ensaiam a volta. Em alguns casos de dolorosa agonia, talvez seja isso o que desejem ouvir. Não sabemos o que acontece lá dentro de alguém que morre, mas sabemos que palavras amigas e ternas e carinho acalmam. O amor ajuda quem acaba de nascer e ajuda também quem sabe que está morrendo. Tira o medo e enche de paz. Pense um pouco sobre essas coisas! Não há nenhuma casa que não passe por isso.
Pe Zezinho scj