Eu vi um senhor idoso; o nome era Ezaltino.
Chegara aos noventa e quatro, mas parecia um menino.
Como no tempo de infância, - santo Deus, quantas lembranças!
A voz saia embargada, os olhos já mais viam.
Os ouvidos não ouviam e as pernas já não andavam.
Eu o vi como criança, balbuciar em delírios.
E, se a lucidez voltava, sorria um sorriso largo,
no qual faltavam os dentes, mas nunca faltava humor.
Que distinto este senhor, que voltara a ser menino!
Deitado naquela cama, sentado numa cadeira,
falava do Pai Eterno que ele dizia que vira.
E que não era mentira, porque um velho nunca mente,
apenas a sua mente vai mais longe do que ia!
A pele toda enrugada, pelo tempo encarquilhada,
couro que o tempo curtira alma nunca derrotada,
o velho não tinha medo nem da vida nem da morte.
Entregara sua sorte ao Deus mais velho que ele
e, contudo bem mais jovem,
Porque Deus não tem idade por ser desde a eternidade.
Eu vi um velho assistindo à morte dos outros velhos
e nem se importar com isso!
Eu vi também a paineira, mais velha do que a cidade,
vendo passar tanta gente, sem pose e sem vaidade!
Pássaros cantaram nela, foram centenas de ninhos.
Namorados a buscavam com mil juras e carinhos.
E todo mundo passava. Só ela permanecia,
A cidade ia crescendo e a paineira não morria!
Ei vi o velho Ezaltino sorrir um riso matreiro
por ter ficado tão velho.
Olhei-o duzentas vezes até que entendi seu riso.
A gente rima velhice com os fatos do passado,
mas aquele que envelhece tem o futuro traçado,
com muito mais plenitude do que nós imaginamos:
Achou o que procurava. Nós ainda procuramos!
Pe Zezinho scj